leituras DEZ NA ÁREA, UM NA BANHEIRA E NINGUÉM NO GOL

Quadrinistas deviam ser presos
e açoitados em praça pública



Tudo bem, não chegou a tanto mas é quase isso. Imaginem o seguinte: um bando de quadrinistas se junta e faz um livro com histórias versando sobre futebol chamado Dez na Área, Um na Banheira e Ninguém no Gol a ser lançado em 2002, ano daquela copa que tinha jogo passando de madrugada. Bom, o livro ficou uma maravilha, ganhou prêmio e vendeu o que costuma vender, quer dizer, pouco. Aí, 7 anos depois, alguém achou que esse livro seria bom pra ser distribuído para alunos do terceiro ano na rede de escolas do estado de São Paulo e autorizou a compra e distribuição de uns 1.200 exemplares. Bom, é um livro de quadrinhos, certo? De autores adultos e manjados - Spacca, Maringoni, Allan Sieber, Caco etc - e quem conhece a turma sabe do que a gente está falando, quer dizer, humor politicamente incorreto é um ingrediente que não falta num agrupamento de quadrinistas brasileiros. Segundo os analistas parece que mais ou menos um terço das histórias contém elementos desse tipo, uns palavrões, declarações que denigrem a mulher (que não refletem a opinião do autor da história mas pelo contrário criticam o machismo do meio do futebol) e citação do PCC num jogo entre prisioneiros numa Carandirú satírica. É pra adulto, certo? Ou pra adolescente descolado, sei lá que outra categoria. Não pra guris de 9 anos, certo? Pelo menos, não desacompanhados.

Não sabemos a ordem dos fatores, se denúncias levaram o governo a recolher os livros ou depois do recolhimeto o fato vazou e a imprensa caiu em cima mas o fato é que pouco dano foi feito porque antes que alguma criancinha ficasse a mercê das mentes perversas dos cartunistas, os livros voltaram pra prateleira. De onde nunca deveriam ter saído e aonde quiçá nunca deveriam ter chegado, segundo as opiniões abalizadas do Governador José Serra do PSDB e do apresentador Ratinho do SBT, o popular Carlos Massa. Um achou o livro de muito mau gosto, os desenhos, tudo e o outro quer ver gente ser punida por fazer apologia do PCC. Parece bem óbvio que ninguém leu o livro e infelizmente isso não é surpresa nenhuma. Cada um pega o assunto do jeito que bem entende, um pra se livrar do incômodo de ser chamado de incompentete e o outro pra honrar aquela ideia de que quando escuto falar em cultura puxo logo meu cassetete. Quadrinhos é assim, pena pra entrar nas seções de arte e literatura mas é fácil de ir parar nas páginas policiais. E o pessoal é gente como a gente, só quer ser lido e chamado de meu bem.

Felizmente é possível que a ignorância deles atraia atenção pro livro que ainda está à disposição dos leitores nas boas livrarias do genêro mas infelizmente o caso demostra o quanto a percepção geral das histórias em quadrinhos ainda é uma coisa nebulosa, cheia de culpa, medo e desconhecimento. Ninguém quer que obras inadequadas sejam impostas aos alunos de nenhum lugar mas seria lamentável se esse caso acabasse gerando uma paranóia que evite a adoção de quadrinhos na sala de aula, uma prática que vem aumentando recentemente para felicidade dos autores e alunos.

Fabio Zimbres

Mais informações aqui: Blog dos Quadrinhos, aqui: Blog do Samuel Casal, e aqui Blog do André Forastieri.